*Abaixo apresento o inicio o artigo escrito para servir de material de apoio enquanto fui docente de uma universidade de ensino a distância. Material utilizado como base de estudo das alunas de pedagogia 3º e 4º semestres.
O artigo foi feito a partir do tema de pesquisa escolhido para meu TCC, em 2007, onde conheci de perto uma escola rural e a educação de assentados e movimentos sociais, bem como a Universidade Florestan Fernandes em Guararema - SP.
Ao longo de nosso processo histórico nos deparamos com diversas políticas e modelos educacionais, que nem sempre são alcançados e adequados a todos os grupos existentes em nossa sociedade. Seja pelo
tipo de educação e teorias propostas ou pela distância e questões de acesso e estrutura.
Nem sempre, cada grupo cultural ou comunidade encontra um lugar nos currículos escolares, o que pode ser fator influente para a evasão escolar de alguns grupos. Um padrão de atitudes, currículos, formas de
ensinar e conteúdos podem não ser visto como significativo para determinados grupos sociais, porque não levam em consideração a história, os valores, rotina e as necessidades diferenciadas que eles possuem. Essa relação de proposta pedagógica de suposto “padrão universal” e grupos sociais sempre geraram turbulência, levando assim à criação de movimentos sociais organizados que começaram a adaptar, a exigir e remodelar as práticas educativas, criando propostas pedagógicas diferenciadas, voltadas a cada realidade, a cada necessidade. Os movimentos sociais se transformam nos novos personagens do cenário educacional, oferecendo formação além das tradicionais sala de aula, o que não vem a ser Educação Informal, mas sim de educação adaptada e revista, de processo ensino-aprendizagem inovado e significativo. Para os movimentos sociais a Educação insere-se dentro de um Projeto sociocultural,
que abrange todo o cotidiano das comunidades e todos os setores criados pelas mesmas (setor de saúde, direitos humanos, frentes de trabalho, cooperativas, núcleos folclóricos).
Quando crianças e jovens de determinadas comunidades freqüentam a escola regular, acabam por sofrer preconceitos e sentem-se desmotivados a retornar. Outra questão que pode contribuir para a exclusão desses alunos vem a ser a distância física de algumas comunidades em relação ao centro escolar, como também a falta de condições econômicas das famílias, o que obriga a todos trabalharem, inclusive as crianças, deixando a educação de lado e não como sendo uma condição obrigatória.
Vale observar que as crianças, jovens e adultos que pertencem a grupos ou movimentos sociais vão se tornando mais politizados e questionadores, devido a uma rotina de vida diferenciada, o que muitas vezes causa desconforto em educadores de escolas regulares, preparados dentro do conceito de apenas transmitir saberes e não a provocar criticidade em relação a fatos sociais. Por serem alunos mais
questionadores, os educadores, na maioria das vezes não sabem como lidar e aproveitar tal capacidade de debate desses alunos, porque não se abriram ainda a essa transformação educacional que vem ocorrendo e não foram capacitados para lidar com essa nova
realidade, que ainda gera preconceitos e inquietação.
Os movimentos sociais em sua maioria são baseados em ideais humanistas e com forte ligação as teorias do educador Paulo Freire, que sempre defendeu uma educação que contribuísse com ações de transformação do mundo, do sujeito passivo não questionador, para o aluno sujeito ativo, cidadão, politizado e com visão critica e de cooperação, de trabalho em coletividade.
A educação dentro de movimentos sociais está sendo produzida em movimento constante, dentro e fora de salas de aula, improvisadas, adaptadas, com calendário diferenciado ao ano letivo das escolas regulares, com professores atentos a uma formação mais humana e principalmente porque está sendo embasada no reconhecimento da realidade verdadeira do aluno, considerando todos os momentos de sua rotina, momentos de aprendizado e todos os envolvidos nestes momentos como educadores. Desse modo, quebra-se o paradigma de que o professor formado é o único transmissor de saberes e dotado de todo conhecimento, e que o aluno nada sabe além do que é dito por ele dentro de um currículo programado. Para os movimentos sociais, a Educação é dialógica, problematizadora, voltada para participação e conscientização do papel de cada um e de seus direitos e deveres dentro da sociedade. Tal fato exige uma postura crítica de educador e educando, para que “juntos” possam possam aprender a entender e agir no contexto no qual estão inseridos.
Vale lembrar que os grupos, e posteriormente os movimentos sociais, se apropriaram de aprendizados informais adquiridos na luta por seus direitos, formulando e agregando questões pedagógicas novas, às questões pedagógicas tradicionais. As questões pedagógicas referidas não são apenas norteadoras dos movimentos sociais, de certa forma, elas abordam todo o contexto educacional em que nossa sociedade está inserida.
ALGUMAS QUESTÕES
Como ocorre e quais os sujeitos (grupos e movimentos) que estão construindo e criando a espacialização de uma nova proposta pedagógica?
Diversos movimentos sociais estão interagindo e contribuindo na área pedagógica, através de novos modelos de escola e de novas metodologias de ensino.
Encontramos escolas indígenas, afro e quilombolas, de trabalhadores rurais e diversos outros grupos que vão produzindo uma interculturalidade, interdisciplinariedade, fortalecendo a relação teoria e prática (aplicando de fato conhecimentos), resgatando valores e preservando a história que vem sendo pouco acessada diante de um
mundo aberto apenas ao novo.
Os movimentos sociais organizam-se em setores, favorecendo a troca de experiências. Criam uma estrutura multi-dimensionada e em movimento constante, com organização de atividades, instâncias de representação em diversos órgãos educacionais e administrativos, passando assim a interferir em currículos e projetos educacionais.
Os setores educacionais da maioria dos movimentos sociais se transformam ou deixam de existir conforme uma determinada necessidade, mudança política, adaptação a grupos. Não existe algo padrão e fixo dentro de uma educação que acontece em movimento dialético, porque ela é feita de experiências e troca, que quando não são bem sucedidas ou não partem de um coletivo são logo anuladas e refeitas.
Para os movimentos sociais, educar é algo inserido no cotidiano, não depende de um horário programado e nem mesmo de paredes e quadro negro. Todo lugar, toda hora é espaço para aprender e ensinar.
É pela educação que os movimentos sociais vão criando bases sólidas para sua expansão.
E sobre as políticas públicas? A educação dos movimentos sociais segue leis e é reconhecida?
A maioria das políticas públicas que foram divulgadas e voltadas à educação , direcionadas a grupos como: população rural, quilombolas, indígenas, possuem aspectos culturais vistos como intolerantes por algumas comunidades.
Um currículo padrão, oriundo da escola urbana e regular, baseada apenas em verticalidade, onde professores e comunidade não participam de sua composição, não alcança êxito em comunidades com outras realidades e valores.
Ainda está presente uma certa concepção de acabar, apenas, com o analfabetismo para a população do campo, população afro ou para quilombolas e índios. Essa concepção, limitada apenas a alfabetização de primeiras letras e ao contar para operações matemáticas básicas, não satisfaz aos grupos culturais.
Outra prática educativa dirigida especialmente a tais populações é a capacitação para o trabalho (principalmente no caso de comunidades rurais). Esses tipos de práticas acabaram por promover uma questão cultural que é: dar o básico para que eles sobrevivam onde estão ou estudo para que eles saiam de suas cidades e moradias para um lugar “melhor” ou que sigam para a cidade mais urbanizada e próxima e para a escola regular, passando a integrar o que já é comum à todos, ficando assim mais fácil o contato com educação, sem que seja necessário rever as políticas e capacitar educadores. Anulam-se então, culturas e identidades.
Qual é o respaldo legal das práticas educativas dos movimentos sociais?
A respeito da legislação, podemos indicar:
• Constituição de 1988 afirma o direito à educação básica, abrangendo todos os níveis e modalidades de ensino (neste momento existe a abertura para que todas as comunidades citadas tenham acesso à educação em todos os níveis, sem exclusão).
• A Lei de Diretrizes e Bases da Educação – LDB, 9394 de 1996, determina em seu primeiro artigo que: ” A educação deve abranger os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de
ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais” . No momento em que a LDB reconhece a existência dos movimentos e espaços como ambientes de aprendizagem, temos outra abertura.
• A LDB também reconhece a diversidade sócio-cultural e o direito à igualdade e diferença, proclamando uma formação básica que envolva especificidades regionais e locais (outro espaço para a revisão de teorias pedagógicas).
• LDB – Artigo 26 preconiza o fato de que os currículos de ensino fundamental e médio precisam ter uma base nacional comum a ser complementada e uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura da economia e da clientela (Neste ponto, encontramos espaço para a inserção de assuntos relacionados à rotina de cada comunidade, bem como de atividades culturais das mesmas).
• Para as escolas rurais, por exemplo, temos o artigo 28 que diz que na oferta da educação básica para a população rural, os sistemas de ensino proverão as adaptações necessárias a sua adequação, à peculiaridade da vida rural e de cada região, especialmente: conteúdos curriculares e metodologias apropriadas ás reais necessidades e interesses dos alunos da zona rural, organização escolar própria, incluindo adequação de calendário escolar as fases do ciclo agrícola.
• A lei 9424/96 que regularizou o Fundo de Desenvolvimento do ensino fundamental e valorização do magistério – FUNDEF aborda a diferenciação do custo por aluno em escolas rurais, reconhece a necessidade de maiores recursos para essas populações.
• A lei 10.172/2001 que instituiu o Plano Nacional de Educação - PNE comenta dentro do que se refere ao ensino fundamental, que escolas, como a escola rural, por exemplo, necessita de tratamento diferenciado, porque o ensino necessita chegar a
todos os recantos do País, considerando peculiaridades regionais e sazonalidades.
• 1997 – PCNS para ensino fundamental: O documento ressalta que existem conhecimentos necessários a formação de todo cidadão, independente da condição social, territorial e socioeconômica.
Vale ressaltar ainda que o aluno, independente de sua localidade tem o direito de estudar e aprender, e tal direito é dever e garantia do Estado.
Todas as leis aqui referidas abordam, em sua maioria, apenas o oferecimento de educação básica, o que também exclui e limita os integrantes de movimentos sociais de atingirem outras formações.
Os movimentos sociais visualizaram tais espaços dentro das políticas públicas e suas leis e inseriram um modelo de educação próprio. São Propostas construídas pela sociedade civil e com aspecto histórico desde a década de 1970 com apoio de partidos políticos, Igrejas e Universidades. Período em que o educador Paulo Freire fortaleceu a educação popular com sua forma de alfabetizar e pensar a educação.
Continua na próxima postagem ...
Aguardem!
Nenhum comentário:
Postar um comentário